Cida Chagas

19 de nov de 2022

Atitudes da adolescência negra

Esses adolescentes denunciaram as mensagens racistas de seus colegas e não se intimidarem em expor os seus rostos e suas vidas.

Eu acredito é na rapaziada. É, Gonzaguinha estava certo. Devemos concorda com ele.

“Eu acredito é na rapaziada

Que segue em frente e segura o rojão

Eu ponho fé é na fé da moçada

Que não foge da fera e enfrenta o leão

Eu vou à luta com essa juventude

Que não corre da raia a troco de nada

Eu vou no bloco dessa mocidade

Que não tá a saudade e constrói

A manhã desejada(...)”

E vamos à luta. Gonzaguinha

A gente sempre reserva esperanças nas gerações vindouras. Por mais que haja aquela velha questão “ah, no meu tempo, não era assim!”; “ah, no meu tempo era melhor!”; “ah, no meu tempo fazíamos de outra forma!”; “ah, no meu tempo...” ; “ah, no meu tempo...”, não há como a geração adulta presente não manter a esperança em quem vai fazer o futuro. Se não, resta quem?

Esse mau-humor com a geração mais jovem, é registrado desde Sócrates, o filósofo que viveu 400 anos antes de Cristo. Veja o que ele dizia:

“Os jovens de hoje gostam do luxo. São mal comportados, desprezam a autoridade. Não têm respeito pelos mais velhos, passam o tempo a falar em vez de trabalhar. Não se levantam quando um adulto chega. Contradizem os pais, apresentam-se em sociedade com enfeites estranhos. Apressam-se a ir para a mesa e comem os acepipes, cruzam as pernas e tiranizam os seus mestres”.

Parece tão atual. É só a gente puxar pela memória o que as nossas mães e pais deixavam escapar das suas bocas quando éramos adolescentes, sobre nós, nossos amigos e desconhecidos célebres ou não. Bastavam ser jovens.

Mas, a quem deve a formação da geração mais jovem? Às gerações passadas e presentes. Uma das mudanças que temos presenciados é jovens adolescentes defendendo os seus pontos de vista e defendendo a suas existências. Se por um lado a Internet e as redes sociais são criticadas pelas suas distorções, por outro permite manifestações como nunca se viu antes. Vamos tomar os recentes casos de denúncias de racismo que adolescentes enfrentaram. O que me ajuda a desenvolver a educação geracional e o porquê acredito na rapaziada.

Estudante é vítima de racismo em troca de mensagens de alunos de escola particular da Zona Sul do Rio

“Uma adolescente negra que estuda em uma escola particular em Laranjeiras, na Zona Sul do Rio de Janeiro, foi vitima de racismo. Em mensagens trocadas por meio de um aplicativo, Ndeye Fatou Ndiaye foi xingada e humilhada por ser negra. A família registrou o caso na Polícia Civil. "Eu recebi mensagens dos meus professores de História, eles se sentiram fracassados. Só que eles não fracassaram, porque este é um pequeno grupo de alunos. Estamos em 2020, são diálogos que não deveriam estar acontecendo. Foi uma coisa que me deixou bastante indignada e triste pelos meus professores", explicou a estudante.”

Criança de oito anos é vítima de racismo em escola de Piracicaba

“Depois de saber dos ataques, o pai da criança entrou em contato com a direção da escola e foi informado de que providências seriam tomadas no sentido de orientação. O pai relatou ainda que depois dessa conversa, a filha passou a sofrer preconceito racial de outros colegas de classe. A menina afirma que os ‘colegas’ a deixaram de lado e proferiram ofensas como ‘o que você está fazendo aqui, some daqui. Você não tem direito de escrever na lousa porque você é preta. Você é faxineira preta’ ”

Quero fazer a diferença contra o racismo

Em entrevista à DW, Antônio fala sobre a indignação que sentiu ao ver o conteúdo compartilhado no grupo de WhatsApp e sobre o que motiva sua luta antirracista. "Mesmo que algumas daquelas mensagens não tenham sido direcionadas diretamente a mim, me afetaram, porque afetam toda a raça, né? O racismo é um crime que é cometido contra a raça, não é só contra uma pessoa", afirma.

“Estão tentando nos calar”, diz mãe de aluna que sofreu racismo em escola do Rio de Janeiro

Camila Barbosa, mãe da modelo e aluna do Centro Educacional Colúmbia 2000, em São João de Meriti, Região Metropolitana do Rio de Janeiro, Ana Victória Barbosa, denuncia que a escola onde a filha estudava tem tentado “calar” quem se manifesta contra a instituição. Segundo ela, desde que o caso de racismo na escola foi exposto, em julho deste ano, ela e outras pessoas, que já passaram pela mesma situação, têm recebido “notificações extrajudiciais” de representantes da escola.

Esses adolescentes denunciaram as mensagens racistas de seus colegas e não se intimidarem em expor os seus rostos e suas vidas. Os discursos que esses jovens apresentam dão esperança de que haverá sim um mundo melhor, pois estes jovens demonstram que está se formando uma consciência sobre si mesmos, sobre as suas histórias, raízes e que ninguém é melhor em razão de sua cor de pele; que toda e qualquer pessoa merece respeito. Muito além disso, demonstram que tem orgulho do que são e não se deixam dobrar.

São ações que nos dão elementos para entender o processo de formação desses jovens e de bradar aos quatro ventos sobre a necessidade de uma educação antirracista. Muitas mães, pais e responsáveis tem receio sobre como abordar questões raciais com jovens. Como traz o “Guia para mães e pais lutarem contra o racismo, pela igualdade e justiça”, adolescentes estão mais propensos a entender movimentos políticos e sociais em sua complexidade; e, portanto, deve-se criar um espaço aberto e saudável para o diálogo.

Esses jovens olham muito para os seus adultos. São os exemplos. Não existe aquela antiga máxima “faça o que eu digo, não faça o que eu faço”. Isso não funciona. É importante que jovens adolescentes saibam sobre as injustiças atuais, do passado e casos em que as pessoas se manifestaram corajosamente. Hoje em dia, não dá mais para se sentir desconfortável em iniciar uma discussão sobre racismo e a desigualdade racial. Por que a realidade se impõe. Insultos racistas viralizam quase que diariamente. Pais, mães e escolas tem um papel fundamental na construção de uma educação antirracista. Educar crianças, adolescentes e jovens de todas as matizes de cores humanas. De todas as origens sociais. De todas as origens culturais. Educarem sobre a história e o presente da população negra no Brasil e no mundo. Educarem sobre os povos originários deste país. Educarem para não estranharem e insurgirem todos os seus preconceitos ao conviver com pessoas negras.

Não é possível mais a omissão, pois jovens negros não estão mais dispostos a silenciarem e carregarem sozinhos todo o fardo do racismo.